'Um livro com a pretensão de explicar a complexidade de uma das figuras mais misteriosas da história só poderia render mais dúvidas. No conto dramatizado de J. Randy Taraborrelli, Michael Jackson – A Magia e a Loucura, o Rei do Pop é protagonista e pano de fundo de uma das sagas familiares americanas mais espetaculares que já se viu.
Mas se de um lado temos um “jornalista investigativo” com arrogância suficiente para se considerar o mais conhecedor no mundo de “insiders” de Jackson, de outro temos um profissional de meias-verdades — e as verdades, nesta biografia não-oficial, mais doem do que orgulham.
Autor do best-seller Madonna – Uma Biografia Íntima, Taraborrelli tem fama e uma carreira notável no campo midiático. Já foi repórter do The Times,do Daily Mirror e da revista Paris Match. Hoje, o jornalista é consultor da emissora norte-americana CBS News, mas segue dando as caras como biógrafo de celebridades, uma vez a cada eclipse.
Sua relação com Michael Jackson é de longa data. A primeira entrevista foi em maio de 1972. A última é de fevereiro de 1998. Desde a primeira página do livro até os capítulos finais, nota-se o empenho de Taraborrelli na reconstrução de detalhes importantes — e outros nem tanto — da vida de Jackson. Utilizando fontes ora críveis, ora absurdamente bizarras, o jornalista romanceia um mundo fantástico em que Jackson é como eu e você e, ao mesmo tempo, completamente isolado em seu próprio mundo.
De longe, o maior trunfo do autor em A Magia e a Loucura está na análise investigativa da história da família Jackson e sua relação com o showbiz. A narrativa é extremamente marcante e instigante nesta parte em especial — que ocupa nada menos que meio livro.
Nas passagens, descobrimos um Joe sensível por trás do homem de ferro e uma Kate agressiva por trás da fiel testemunha de Jeová. Taraborrelli revela também a face obscura e desprezível de Joe, com uma profundidade que será inédita mesmo para fãs devotos de Michael.
O patriarca da família Jackson aparece como um coadjuvante para virar gradualmente protagonista de uma história em que o filho mais famoso, na sua incessante busca pelo afastamento da imagem do seu pai tirano, termina herdando, sem nem notar, alguns dos estigmas mais característicos de Joe. Desde a transformação do homem no espelho até a constituição do homem Michael Jackson — o pai de família —, a biografia traça paralelos perturbadores entre a psicologia de ambos. E é difícil não sentir um pouco de pena de Michael.
Outras revelações prometidas pelo jornalista não passam de tópicos freqüentes na lista de debates de fãs. Uma delas é a intensa vida sexual de Michael Jackson e Lisa Marie Presley. Amigas de Lisa contam como a herdeira do Rei do Rock se apaixonou por Jackson e se tornou escrava do seu corpo.
Os detalhes, mesmo que já batidos, agradarão muitas fãs em particular. No geral, esta é uma das abordagens mais completas e esclarecedoras a respeito da relação entre os dois membros da realeza musical. Falando em relações, um outro ponto de destaque é o envolvimento de Michael com estrelas de gerações anteriores a ele como Diana Ross e, mais tarde, Elizabeth Taylor.
Diferentemente do que se pode pensar, ambas aparecem mais como penetras importantes e, ao mesmo tempo, demasiadamente invasivas da vida do Rei do Pop. Uma cena hilária que o livro aborda em detalhes é o embaraçoso encontro de Michael com as duas — logicamente, sem que uma soubesse da presença da outra, com antecedência. Trata-se de um dos raros trechos agradáveis do livro em que a leitura respira de forma descontraída.
Com algumas exceções, a história de Taraborrelli segue factual e objetiva até um certo ponto na segunda metade do livro. Numa tentativa sem sucesso de parecer imparcial, o jornalista escorrega na subjetividade da sua tese, ora culpando os próprios fãs de Jackson, ora jurando de pés juntos que a mídia não foi a culpada pela ruína da carreira do popstar.
Como suas histórias mais bizarras, é igualmente perturbador deparar com a teimosia jornalística de Taraborrelli fazendo eco aos clichês midiáticos mais freqüentes do mundo do entretenimento. No fim, acabamos com um conto fantástico em nossas mãos no qual não sabemos distinguir com exatidão as partes de especulações das partes de legitimidades factuais.
É quase como ter O Código Da Vinci em mãos, sem um conhecimento prévio a respeito dos seus assuntos de cunho religioso e artístico. Neste ponto, sim, vemos a magia se confundir com a loucura.'
Mike Beats
Fonte: MJBeats