My Friend Michael (29)


'Apesar de ter sido tecnicamente casado com Debbie, Michael via-se como pai e mãe para os filhos. Este duplo papel se solidificou em Outubro de 1999, quando, após três anos de casamento, Debbie Rowe entrou com o pedido de divórcio.

Ser casado com Michael tinha tirado um pouco de sua privacidade. Ela não conseguia nem andar em seus cavalos sem ser perseguida pelos paparazzi. Ela esperava que o divórcio desviasse a atenção dela, e ela o fez. De outra forma, o divórcio não mudou nada.

Embora ela e Michael ainda estivessem em termos amigáveis, Debbie raramente ia à Neverland. As crianças não tinham o hábito de vê-la, então não houve interrupção de suas vidas.

No final, não havia nada chocante sobre a sua decisão: ela simplesmente sentiu que era a inevitável conclusão de um acordo que, segundo Michael, tinha sido baseado em seu negócio com o príncipe Talal bin Al-Waleed, desde o início. Nem Michael nem eu ficamos incomodados por isso.

Com o final de 1999, era cada vez claro para mim que toda a minha vida girava em torno de Michael. Pode parecer uma posição estranha -estar na sombra de tal megastar e perpetuamente de plantão -  mas eu nunca pensei nisso dessa maneira.

Eu nunca poderia ser Michael, nem queria ser. Eu não queria os holofotes. Eu não era e nunca serei um cara feito para os holofotes. Eu senti o mesmo senso de direção que ele sempre me inspirou. Todo dia eu sabia o que tinha que fazer, e eu acreditava no que eu estava fazendo. Aprendi com ele e absorvi como ele via o mundo, baseado em sua gentileza, respeito e atenção.

Eu também me sintonizei com os traços mais difíceis de Michael. Ele poderia ser desconfiado e excessivamente sensível, propenso a emoções extremas e tirar conclusões precipitadas. Para combater isso, eu tinha o cuidado de ouvir. Para observar tudo. Para pensar antes de falar.

Ele não gostava que lhe dissessem o que fazer, então se eu tinha uma opinião, eu a lançava, então ele poderia pensar (ou 'fingir') que ele a tinha por conta própria. Quanto melhor eu o compreendia, mais forte e mais estável a dinâmica entre nós se tornava.

Eu estava interessado no negócio do entretenimento por um longo tempo. Agora eu o estava vivendo, e todas as complexidades que vinham com ele. Embora Michael estivesse começando a trabalhar em Invincible, seu negócio e ambições criativas estendiam-se muito além da música.

Ele estava sempre avaliando novas oportunidades de casinos, ramo imobiliário, start-ups, cinema e trabalho humanitário. No topo desses projetos, que estavam normalmente em vários estágios, desde o início à execução, havia a gestão de Neverland e seu negócio da música e da parceria com a Sony.

E depois, claro, houvia o agendamento de viagens para suas aparições, honras e compromissos. Parece muito, e era. Michael tinha toda uma equipe de assessores e pessoal de apoio para lidar com esses empreendimentos e responsabilidades.

Quando eu era criança, as pessoas que eu conheci na organização de Michael eram principalmente os que o ajudaram em uma base diária: pessoas de segurança, motoristas, o pessoal da maquilagem e guarda-roupa e assim por diante.

Como o negócio de Michael Jackson era executado era praticamente invisível para mim. Agora começava a ver como era complexa a gestão. Apesar de eu não ter formação profissional formal, fiquei face a face com a infra-estrutura da organização de Michael.

Havia advogados, administradores, contadores e publicitários. E não era apenas um advogado ou um gerente. Era uma equipe de advogados e uma equipe de gestores. Eles estavam todos envolvidos em cada negócio, e às vezes, eles tinham agendas diferentes.

Por exemplo, se Michael queria investir em uma empresa, os gestores queriam ter certeza de que o negócio não iria interferir em seus compromissos de música, o pessoal da publicidade o queria para servir à sua imagem pública, e os advogados queriam ter certeza do negócio não entrar em conflito com suas outras obrigações legais.

E ainda, para todos esses outros interesses, Michael queria concentrar sua energia em seu próximo álbum, então ele me pediu para representá-lo quando as suas obrigações musicais ficavam no caminho.

'Estas pessoas trabalham para você' ele me disse.

Tecnicamente, quando falava por Michael, eu era o chefe, mas sendo extremamente consciente do meu novo status, eu tentava ser o mais educado e cauteloso possível. Toda a cortesia do mundo não teria me ajudado a superar os primeiros meses, porém, se não fosse por Karen Smith.

Trabalhando em um escritório em Los Angeles, Karen era assistente-executiva de Michael, mas ela era muito mais do que isso. Karen tinha trabalhado para Michael desde que eu conseguia me lembrar. Ela sabia tudo o que estava acontecendo na vida de Michael e mantinha tudo organizado. Se eu não soubesse a quem chamar, eu chamava Karen.

Michael não tinha senso do tempo ou programações de outras pessoas. Ele chamaria qualquer pessoa - meus pais, Karen - a qualquer hora da noite. Também não tinha um senso de prioridade. Ele poderia chamar Karen às três da manhã e dizer:

'Karen, você pode acreditar que um dos flamingos morreu? Um animal entrou e o matou. Você pode ligar e dizer que eu quero outro flamingo? E certifique-se de que nenhum animal alcance a sua ilha.'

Dia ou noite, Karen sempre tinha papel e caneta em mãos e anotava seus pedidos sem reclamar. Ela poderia coordenar tudo. O mito da super-mulher Karen era agravado pelo fato de que ninguém nunca a viu pessoalmente. Ela sempre foi apenas uma voz no telefone. Aquela voz era, ao mesmo tempo, simpática e profissional.

Às vezes, no final de um dia duro, se eu precisava desabafar, eu chamaria Karen. Não era como eu poderia chamar a minha melhor amiga e me queixar do meu chefe ou pedir conselhos. Cada elemento do meu trabalho era confidencial. Mas Karen era a pessoa mais leal na organização de Michael.

Ela tinha visto e passado por tudo antes. Ela era a única pessoa no mundo em quem eu poderia realmente confiar quando chegava para trabalhar. Por Karen e por agir pelos meus próprios instintos, eu aprendi que a melhor maneira para ajudar Michael a tomar decisões era reunir todos os fatos sobre uma determinada situação e apresentá-los a ele. A partir daí, Michael tomaria as decisões, e eu as executava.

Apresentar-lhe todos os fatos parecia uma abordagem óbvia, mas com o passar do tempo, eu percebi que nem todos tinham seus melhores interesses em mente. Nem sempre era dado a Michael o cenário completo. Este era um problema de sua própria criação: ele só queria ouvir o que ele queria ouvir.

Seus contadores e advogados parecia dedicados. Mas alguns de seus sócios nos negócios, ávidos por lucro, falavam sobre os benefícios e minimizavam os riscos. Eu não tinha experiência, mas pelo menos eu tinha uma perspectiva objetiva. Eu não tinha agenda oculta, e minha única intenção era ajudar Michael.

Como eu ganhei confiança, me tornei mais do que a voz substituta de Michael, simplesmente retransmitindo os seus desejos; para melhor ou pior, eu comecei a pesar com minhas próprias opiniões.

Durante minha infância e adolescência, Michael tinha criado em mim a noção de que eu não poderia confiar em ninguém. No começo, eu descartei isto como paranóia, mas até o final de 1999, cheguei a ver a sua falta de confiança como um mecanismo de sobrevivência essencial.

Quanto mais tempo eu passava com ele, mais eu vi que em seu mundo, o ceticismo era uma defesa necessária. Os problemas foram muito além da negligência que eu tinha visto em sua equipe de Neverland.

Ele vivia em um mundo onde todo mundo queria alguma coisa dele. Eles reagiram à sua fama e sucesso com inveja e ganância. Isto era verdade mesmo entre seus sócios mais próximos. Era um ninho de víboras.

Minha transformação foi mais ou menos como a de Michael Corleone em O Poderoso Chefão. Antes de Michael (Corleone) se envolver com os negócios da família, ele era bom e ingênuo. Uma tarefa simples. Mas quando seu pai levou um tiro, ele fez o que tinha de ser feito. Á noite, ele se transformava em um assassino.

Eu tinha sido o Frank amigo, o Frank confidente, o Frank assistente. Agora que Michael queria que tudo passasse por mim, eu estava ferozmente determinado a usar os meus poderes para o bem.

Eu sabia que havia riscos envolvidos: Michael tinha me avisado que as pessoas não gostavam de receber ordens minhas, e eu suspeitei que se eu entrasse no caminho de alguém, elas poderiam reagir de forma agressiva, mas eu não ligava.

Houve momentos em que Michael não queria ver ou ouvir tudo o que eu tinha que contar a ele sobre a corrupção que eu suspeitava de membros de sua organização. Ele dizia: 'Frank, você só começou aqui. Você não sabe o que você está falando. Este é um mundo diferente.' mas eu sempre contava como eu via.

Esse era o meu trabalho para fornecer uma perspectiva imparcial, pela qual Michael poderia tomar ou deixar, como bem entendesse. Desafiando os dias,  nunca parei de sentir e expressar minha gratidão a Michael.

Não havia um dia que passava quando eu não dissesse: 'Obrigado por tudo. Eu te amo.' Em cada noite, nos dávamos um abraço. Eu o reconhecia e o apreciava.

Mas a vida no ano que estava por vir iria ficar mais complicada, e o comportamento de Michael poderia puxar minha lealdade em duas direções, e a sinceridade de nossa relação ao longo da vida estaria ameaçada pela primeira, mas não pela última vez.'